Thomas Merton e a Oração Contemplativa
O Centro de Estudos de Sumaré recebeu, entre os dias 19 a 21 de outubro de 2018, mais uma edição do Retiro anual da Sociedade dos Amigos Fraternos de Thomas Merton, com o tema Thomas Merton e a Oração Contemplativa: Deus no coração e o coração em Deus; pregado por Dom Bernardo Bonowitz, OCSO.
Baseado no último livro escrito por Merton, publicado postumamente em 1969, A Oração Contemplativa ganhou recente edição no Brasil. Este livro destaca o papel indispensável da contemplação na purificação e no movimento em direção à autenticidade da vida cristã, com a linguagem lírica, amorosa e profética peculiar do monge trapista.
A reflexão proposta por Thomas Merton é, em primeiro lugar, para monges cristãos – para ele esta realidade da oração contemplativa precisa ser resgatada nas comunidades monásticas e na Igreja. Por este motivo, algumas vezes as palavras de Merton soam como as de “um profeta irado”, mas logo dão lugar àquelas palavras portadoras da experiência amorosa e do desejo de que todos, inflamados pela graça, possam ter a experiência da oração contemplativa e produzir frutos para o Reino.
Dom Bernardo desenvolveu o tema em cinco conferências:
1 Na primeira foi destacado as principais distinções entre a contemplação e a religiosidade. A oração contemplativa é uma graça divina provinda do mistério de Deus e não pode ser “autoescolhida” e usada para fugir das questões centrais da vida humana e da vida em sociedade, se assim o fizer nada mais é que uma “pseudo-contemplação” estéril de frutos. Portanto, para Merton, essa seria fruto de uma “piedade” anti-encarnacional que não consegue enraizar-se na vida e, deste modo, permanece distante da pessoa de Jesus.
2 A segunda conferência tratou da necessidade de dispor-se para a contemplação. Aquele que já recebeu, em Jesus Cristo, todas as graças necessárias para sua vida espiritual, precisa necessariamente voltar-se para essa realidade e viver uma conversão constante para as coisas do Alto. Deus quer precisar de nós constantemente e chama para colaborar com sua graça. A resposta deve ser a entrega à sua vontade. Foi pontuado, ainda, os ensinamentos dos Padres do Deserto e seu modelo de oração centrado no amor à Palavra de Deus, na meditação do Nome de Jesus e na Oração do Coração.
3 Na terceira conferência o tema central foi a contemplação e a purificação do conhecimento. Merton se baseia em João da Cruz para desenvolver o “conhecimento unitivo e místico” com Deus, e ao entrar nestas sendas profundas o “mistério inexplicável” não pode ser tratado com a linguagem científica e teológica tradicionais, pois estas são incapazes de fazê-los – somente a linguagem mística com suas alegorias e símbolos pode empreender algum sucesso. Esse processo é permeado pela meditação que purifica o conhecimento de Deus, não obstante a sua incompreensibilidade; desse modo, a meditação possibilita a aproximação com tão grandioso mistério.
4 A quarta conferência enfocou a contemplação e purificação de relacionamentos. A intuição básica e provocativa para o desenvolvimento do tema girou em torno da noção de dread – temor –, que deve ser aceito, sofrido e transcendido na contemplação; tal noção é utilizada como paradigma do vínculo do ser humano com Deus. Essa relação é de dependência e contingência uma vez que o ser humano é criatura e Deus, criador. Ocorre que esta familiaridade é muitas vezes negligenciada, o que resulta no sofrimento e na dificuldade de aproximar-se do núcleo da vida contemplativa. Por fim, o dread, enquanto insegurança fundamental, permanece um fator misterioso, mas também mola propulsora para o mergulho na oração contemplativa e na “recuperação” do elo perdido na relação com Deus.
5 Na quinta e última conferência foi apresentada a contemplação como caminho para purificação da comunidade cristã. A vocação e a oração contemplativa saem do âmbito “privado” de um mosteiro e irradia a todos os homens. A negação da eventual “tragicidade” da vida e de acontecimentos históricos dão lugar a uma presença, nascida da intuição da fé rumo à liberdade necessária em relação a sistemas e ideologias. O cristão, mergulhado e purificado na/e pela oração contemplativa, colabora com a missão da Igreja de salvar e transformar a humanidade, chamando todos a sua única e necessária tarefa: instaurar o Reino de Deus pelo amor brotado do coração de Deus.