Tarde da noite. A maior parte dos cafés de Paris cerrou suas portas, baixou seus postigos, trancando-se para o lado da rua. Luzes refletem-se brilhantemente nos passeios úmidos e vazios. Um táxi para para pegar um passageiro e parte de novo e a luz vermelha da traseira desaparece ao dobrar da esquina.
O homem que acaba de apear-se segue um empregado pela porta giratória até o vestíbulo de um dos maiores hotéis de Paris. Sua mala de mão pintalga-se de etiquetas europeias com os nomes de hotéis de que existiam nas grandes cidades europeias antes da Segunda Guerra Mundial. Mas o homem não é um turista. Vê-se logo que é um homem de negócios e importante. Não é essa espécie de hotel procurada por meros voyageurs de comerce. Um francês, evidentemente, e caminha através do vestíbulo como um homem acostumado a hospedar-se nos melhores hotéis. Para um instante, procurando no bolso algum dinheiro miúdo e o empregado vai à sua frente até o elevador.
Sente, de súbito o viajante que alguém está olhando para ele. É uma mulher e, para espanto seu, traz hábito de monja.
Se conhecesse algo a respeito dos hábitos usados pelas diferentes ordens religiosas, reconheceria a capa branca e o burel castanho das Carmelitas Descalças. Mas como um homem na sua posição haveria de saber alguma coisa a respeito das Carmelitas Descalças? É demasiado importante e demasiado atarefado para se preocupar com monjas e ordens religiosas... ou com igrejas a propósito, embora ocasionalmente vá à missa pró-forma.
O mais surpreendente de tudo é que a freira está sorrindo e está sorrindo para ele. É uma jovem irmã, com um brilhante e inteligente rosto de francesa, cheio de candor duma criança, cheio de bom senso e seu sorriso é um sorriso de franca e indisfarçada amizade. Instintivamente leva o viajante a mão ao chapéu, depois torna a voltar-se e dirige-se apressado à gerência, garantindo a si mesmo que não conhece freira alguma. Ao assinar o registro, não pode deixar de lançar uma olhadela para trás. A freira já fora embora.
Largando a pena, pergunta ao empregado:
— Quem é essa freira que acaba de passar por aqui?
— Peço-lhe perdão, cavalheiro, mas que é que o senhor diz?
— Aquela freira... quem é, afinal? Aquela que acaba de sair e sorriu para mim?
O empregado arqueia os supercílios.
— O senhor está enganado, cavalheiro. Uma freira, num hotel a esta hora da noite? Freiras não andam vagando pela cidade sorrindo para homens!
— Sei disso. E por isso mesmo gostaria que o senhor me explicasse o fato de haver uma aparecido e sorrindo para mim agorinha mesmo, aqui neste vestíbulo.
O empregado encolhe os ombros.
— O senhor foi a única pessoa que entrou ou saiu nesta última meia hora.
Não muito tempo depois, o viajante, que viu uma freira no hotel parisiense, não era mais um importante industrial francês e sabia de algo a respeito de hábitos religiosos. Na realidade usava um... Tornara-se monge trapista numa abadia do sul da França.
(...) O que se deve salientar nesta história é que ela é verdadeira. Aquele irmão leigo vive hoje na abadia de Aiguebelle e a razão de achar-se ali pode ser rastejada até o fato de haver entrado numa noite num hotel de Paris e ali haver visto uma freira sorrindo para ele, embora o empregado lhe afirmasse que nenhuma freira ali se achava.
Poucos dias depois vira um retrato da mesma freira na casa de uns amigos. Disseram-lhe que se chamava Santa Teresa do Menino Jesus".