Extraordinário é observar que uma das mais significativas vozes proféticas do século XX, voz que se faz ouvir até hoje em favor da paz, da unidade entre cristãos, da necessidade da oração, pertenceu a um monge trapista mergulhado durante 27 anos no silencio – Thomas Merton.
Após uma juventude tumultuada, é através da poesia de William Blake que Merton encontra Deus. E é também através da poesia que atinge o caminho certo para nossos corações ao pedir paz para um mundo conturbado.
Nada mais atual. Ao mesmo tempo Merton não nos liberta da responsabilidade sobre esse mundo, mostrando-nos que fazemos parte deste círculo mortal, como lemos em sua obra. Profético, antecipa até futuros ataques da guerra moderna, sem nos absolver de culpa. “Não pense que você é melhor porque queima amigos e inimigos com mísseis de longa distância que não lhe deixam ver o que você fez.” Eis Merton em toda sua franqueza e honestidade.
Realista, falando a linguagem de hoje, embora falecido em 1968, recluso em Gethsemani, Kentucky, mas participando dos problemas universais, vê em si mesmo, assim como o ser humano sempre com olhos de misericórdia, compreensão, perdão. “Senhora” – diz em um dos seus poema – “tenho escrito demais e não sou tão bom em palavras como um autor deveria ser.” Menciona também seus cansaços, suas contradições internas, sua confusão, seus temores, seu ativismo. Chama-se ate de pretensioso e embusteiro. Como não nos identificarmos com ele em nossa fragilidade? Sua humilde franqueza se tinge por vezes de humor, até de fina ironia ao falar dos “monges dos queijos” ou quando tenta nos pedir para “ficar nos próprios pés, mas com a cara no chão” ou ainda apela ao poeta amigo Lax para rezar pelas “freiras, comerciantes e Hitler”. Seu delicado amor a natureza, árvores, lírios, abutres, nuvens, raios de sol, riachos, vinhedos, colinas, todos momentos sacramentais, encontros com o Deus vivo, provam sua profunda alegria de viver ao contemplar a beleza do mundo.